terça-feira, 21 de julho de 2009

Escuto tudo o que ele acaba de dizer calado. Distancio-me e me envolvo nestes pensamentos, ele sabe que sou eu quem o influencio, eu sou essa cadência perene que o faz refletir. Ele me chama sem saber meu nome. Isso várias vezes durante o dia, sem ter certeza de que eu existo, sem se convencer de que o abstrato e o concreto se mesclam. Introduzo-me e tento entabular uma comunicação. Ele cético, tenta me explicar a dureza de se deparar com o que sempre idealizou, sem saber mesmo o quê e como e porquê. Que valha alguma coisa, é preciso. Sei que ele me busca, faina diuturna, deposita uma âncora teologal em mim. Não pretendo ser seu redentor. A fechadura está do lado de dentro dele, posso ajudar a forjar a chave, sê-la não. Era noite, e as sombras estavam deslocadas. Selenia escondida, nova, apenas seu espectro me teleguiava. Sussurrava que este seria um dos meus discentes preferidos, (ou o contrário?). Preconcebi o sujeito com um olhar tosco, reneguei levemente meu papel com obliquidade quase frívola, desdém. Rhistoc...Ai, Aleph, você de novo, dissociando-me. Assintonia insistente, pseudo-pedagogia imposta. E Selenia, e Aleph e quem mais? Tudo bem, estou aqui, o quê agora? Lembra-te... Ai, esse eco... Lembra-te pra que viestes... Compadeço-me. Preferia poder escolher, mas me impõem. Este é apenas um deles, haverá outros num total de doze... Doze? Por que doze? Doze não é um número, Rhistoc... Ah, não me venha, com essa voz modulada subconsciente, falando em símbolos! Exatamente, é um símbolo. O doze perfaz toda uma cosmogonia. Doze são as horas de Helios e de Selenia. Com a metade de doze foi criado o que existe e em seguida houve o descanso. Doze serão aqueles que haverás de encontrar e que irão te acompanhar... Observe, ele está em apuros, embriagou-se no ludíbrio da deusa. Está dividido agora, não tem rumo, apenas deseja sair dessa existência lúgubre. Sua vida é um pesadelo perpétuo. Viestes para clarear o horizonte deste e de tantos outros, para mostrar que a terra só está desolada, porque eles assim também estão. O Rei está ferido, mas não há o “Rei” isoladamente, o Rei são eles, ou/e está neles. Eles é que estão feridos. Tu co-participante da dor deles, tua ferida também está aberta. Tu cicatrizante das chagas deles, renasces com eles. E sabes, não há quem te busque que não te possa encontrar. Oh, humanidade, que busca ilógica! Estás o tempo todo neles, com eles. Basta que façam silêncio, basta que parem de dizer a verdade deles e comecem a escutar a tua. Basta que parem de te procurar onde nunca irão encontrar. Tua missão acaba de começar, Rhistoc, e quem pega no arado não deve olhar mais para trás, disto sabes tu. Prepara-te para o que vem a eito.

3 comentários:

wladyfelix@ disse...

De olhar tosco e Anjo Torto todo louco - cético e poeta - tem um pouco.
O quê? O sonho. “sonho no mínimo que não seja impossível dizer que ainda é possível sonhar”
Por quê? Para ser feliz muito além da existência lúgubre, sabendo que a felicidade é humanamente (im)possível, enquanto outros
desolados viverem o pesadelo com o corpo marcado pela dor
e tatuado pelo sofrimento.
Como? Reinventando-se um passado, criando-se um presente e projetando-se um futuro de arte, com amor e amizade, produzindo outros modos de existência: literatura, música, fotografia, cinema, entre outras expressões da criatividade...

Anônimo disse...

reinvente-se.

maiakovski@ disse...

Não é difícil morrer nesta vida:
Viver é muito mais difícil

Maiakovski