Infelizmente, não é o que se tem, nem o que se merece, mas o que se alcança, de uma maneira ou de outra, ou de diversas. Uma vez perdida a proteção do Rei...(oh, Ele está gravemente ferido) a terra ficou toda devastada. Não se escutam sequer os pensamentos, não existem pensamentos, não existem seres pensantes. Não sei como vim parar aqui, mas não foi pro Inferno que me mandaram. Vejo restos de sonhos espalhados por todos os lados, percebo que eles pisam neles, às vezes os despejam no chão e passam por cima, mesmo uns dos outros. Será mesmo que não importa o que está ali jogado, jogado já está. Mas está ao alcance da mão. Suas mãos em pedaços, estão segurando outros desejos, suas bocas tragam as próprias vidas e enquanto aspiram, se desvanecem... Saem a procura do impossível e almejam o que não se pode imaginar. Aqui encontrei a mais pura expressão de fé, a fé em seu estado primário. A antítese da fé: o medo. E esse medo não pode ser mensurado, não se tem medo de nada em toda parte, embora a atmosfera exale medo e terror pulsantes, o medo de não saber do que se tem medo. Pergunto o que aconteceu àquele lugar, àquelas pessoas, ninguem me responde, todos ensimesmados. Então consigo entender que todos estão constantemente buscando algo. Esse algo não é dado, nem se encontra facilmente na natureza como se alguém pudesse apenas ir lá e pegar. É preciso comprá-lo. É muito caro? Não, mas no final paga-se com a vida. É a prazo? Sim, o prazo é você quem faz. Vc pode pagá-lo agora com a sua vida, ou deixar pra ir acabando com ela aos poucos... Não entendi mais uma vez e fui atrás de um grupo que acabara de chegar com a compra desse objeto de desejo. Estavam muito eufóricos. Segui-os até a entrada do templo, e eis que me veio a pergunta: Eles iam sacrificar a vida de alguém nesse templo? Iam sacrificar com alguma arma que acabaram de comprar, o que viria a ser esse objeto de desejo? Apenas sabia que esse objeto era produzido em larga escala, porque eu via outros também saindo pra comprá-lo e voltando muito excitados também. Mas, após eles, resolvi entrar no templo e ver o que ia suceder... eram cinco homens e pelo que percebi apenas tinham conseguido dois exemplares desse objeto. O templo estava, como toda a cidade, em ruínas, mas ainda pior. Havia lixo, latas rasgadas, cinzas por toda parte. O cheiro não era de morte, era de pré-morte. A morte circundando o tempo todo. Pude ver o desejo dela em seus olhos vazios e sedentos. Os demais não a viam, embora sentissem a presença dela por ali, mas não davam importância. O objeto, o objeto! E todos sentaram sobre os entulhos, em círculo, esperando o ritual. Quem detinha o objeto em mãos detinha o poder, o respeito, a atenção e servidão dos demais. Fiquei olhando tudo aquilo de pé, mas ninguém me percebeu ali.
A continuación...To be continued... à Suivre... Continua....
Um comentário:
Lembrei-me do soneto “O Prazer da Pipa” que Patativa escreveu quando um de seus sobrinhos voltou a beber. Lembrei-me também dos versos de outro poema: “Um Mundo Desconhecido” em que o poeta apresenta um experimento com a pré-morte: ...“Em seu mistério ela tem/De cada encanto uma dose,/Na sua metamorfose/Nunca respeito ninguém”...
Félix
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